As Conquistas do Tênis Feminino

As Conquistas do Tênis Feminino

Onze grandes passos na busca pela igualdade de gênero no esporte.


1. O início

As mulheres estrearam oficialmente no tênis em 1884, no torneio de Wimbledon, aproximadamente sete anos após o primeiro campeonato masculino da história que aconteceu no mesmo local. Na época as mulheres jogavam de vestidos de manga comprida, espartilho e chapéu. A estreia nos jogos americanos ocorreu em 1887, e nos franceses dez anos depois.

2. Os Jogos Olímpicos

As mulheres iniciaram nos Jogos em 1900, em Paris, no entanto os jogos eram basicamente de exibição, tendo pouquíssima visibilidade, as atletas não recebiam medalhas. A primeira medalha conquistada por uma mulher só foi entregue 12 anos depois, essa mulher foi Charlotte Cooper, tenista britânica que na época tinha 30 anos de idade. Cooper também venceu as duplas mistas daquele ano, com seu parceiro R. F. Doherty. E já tinha em seu currículo três torneios de Wimbledon vencidos (1895, 1896, 1898).

3. A brasileira que virou o jogo

Maria Esther Bueno considera-se – e quem somos nós pra discordar- uma precursora importante na história do esporte feminino como um todo, não apenas do tênis. Foi a primeira tenista fora dos E.U.A a vencer torneios de Wimbledon e U.S. Nacionals no mesmo ano, e ocupou a primeira posição do ranking internacional em 1959, 1960, 1964 e 1966.
"Mulher no esporte sempre teve, mas nunca com o destaque que era dado aos homens. Depois das conquistas que eu consegui, muitas mulheres se sobressaíram", afirmou, em entrevista à Agência Brasil. "Acho que abri um caminho, principalmente no tênis, na América Latina toda."

4. The Original Nine

Falar das conquistas das mulheres dentro do tênis e não citar Billie Jean King, é impossível. A americana foi uma das maiores responsáveis pelas reivindicações por igualdade de gênero no esporte. Suas ações reverberam até hoje.

Iniciava-se a Era Open do tênis, e as mulheres se viam constantemente deixadas de lado pelas organizações dos torneios de Grand Slam. As atletas nunca jogavam nas quadras principais e seus ganhos chegavam a 12,5% das premiações masculinas. Mas algumas delas se cansaram de toda essa desigualdade.

Foi durante um desses grandes torneios que nove mulheres resolveram se unir e, juntamente com uma dona de revista especializada em tênis, decidiram boicotar o campeonato e organizar um novo, somente para mulheres. O Virginia Slims aconteceu em Houston, em 1970, e reuniu as chamadas “The Original Nine” (As Nove Originais). O sucesso do torneio fez com que a ideia evoluísse para um circuito de competições femininas, no ano seguinte. Diziam que elas estavam “dando um tiro no pé”, mas isso não as impediu.

“Nós sabíamos que, para aquilo ter futuro, nós precisaríamos ter um tour ou uma série de torneios. Não tínhamos ideia do que iria acontecer, mas tínhamos aquele sonho. Nós queríamos que cada menina no mundo tivesse a oportunidade de jogar e de viver do tênis, se assim quisesse”, disse Billie Jean King sobre os acontecimentos. “Nós também estávamos falando sobre coisas além do esporte, sobre mudanças na sociedade. Era o início do movimento das mulheres. Nós fomos felizes pelo momento que escolhemos e acho que participamos desse movimento de alguma forma.”

A partir do circuito Virginia Slims surgiu, em 1973, a WTA (Women Tennis Association), que garantiu as reivindicações das mulheres no tênis mundial. Naquele mesmo ano o mundo presenciaria um evento que entrou pra história do esporte mundial.

The Original Nine: Billie Jean King, Rosie Casals, Julie Heldman, Peaches Bartkowicz, Kristy Pigeon, Nancy Richey, Valerie Ziegenfuss, Judy Dalton, Kerry Melville Reid.

5. A Batalha dos Sexos

O tênis feminino estava quebrando grandes barreiras, e esse momento foi consagrado através de um dos eventos esportivos mais assistidos da história. The Battle of the Sexes (A Batalha dos Sexos) foi transmitida pela televisão, ao vivo, para 90 milhões de pessoa ao redor do mundo. Foi o primeiro duelo entre um homem e uma mulher. Billie Jean King venceu Bobby Riggs por 3 sets a zero (6/4, 6/3, 6/3).

O evento rendeu um filme que foi lançado em 2017, contando com detalhes todo o ocorrido.

6. Resultado da Batalha

A Batalha dos Sexos foi exatamente o que faltava para que novas atitudes fossem tomadas. Após o evento, o U.S. Open determinou a igualdade de premiações para homens e mulheres, o Australian Open só tomou a mesma iniciativa em 2001, seguido por Roland Garros em 2006 e, finalmente, Wimbledon, em 2007, cerca de 34 anos após a fundação da WTA.

7. As Top 10

Hoje, devido a todos os ocorridos dos últimos 60 anos, o tênis é o esporte de menor desigualdade de gênero do mundo. Por exemplo, é o único em que as mulheres são pagas em igual valor comparadas aos homens, pelo menos nos grandes torneios. Além disso, os ingressos para torneios de Grand Slam são vendidos sem especificação de “feminino” ou “masculino”, exceto para finais de campeonato.
Hoje, das 10 atletas mais bem pagas do mundo, 8 são tenistas.

  1. Serena Williams – tênis
  2. Caroline Wozniacki – tênis
  3. Sloane Stephens – tênis
  4. Garbine Muguruza – tênis
  5. Maria Sharapova – tênis
  6. Vênus Williams - tênis
  7. P.V. Sindhu – badminton
  8. Simona Halep – tênis
  9. Danica Patrick – automobilismo
  10. Angelique Kerber - tênis

8. O Golden Slam

É o objetivo mais difícil do tênis. O Golden Slam só foi conquistado uma vez na história do esporte, e foi por uma mulher. E que mulher! Steffi Graff venceu os Jogos Olímpicos de Seoul, em 1988, e, no mesmo ano, os quatro torneios de Grand Slam. O recorde é praticamente impossível de ser alcançado novamente.

9. Os atletas

Infelizmente, apesar de toda a luta, muitos homens do circuito ATP ainda defendem que deveriam ganhar mais do que as mulheres. De acordo com eles, os jogos masculinos atraem mais público e eles não precisam lidar com questões hormonais, filhos, e outras questões fisiológicas.

Mas é exatamente contra essa mídia unilateral, que favorece os jogos masculinos, e contra preconceitos relacionados a questões totalmente fora do controle das mulheres, como hormônios, que devemos lutar. Acabamos de expor que o tênis é o esporte em que as mulheres possuem mais força e credibilidade, se o público está baixo, não é por culpa das jogadoras que se esforçam tanto quanto os atletas, ou mais, afinal eles mesmos afirmam que lidam com menos adversidades do que elas.

10. O jogo e os espectadores

Até hoje é muito comum ouvirmos, entre os homens, a seguinte frase: “Só assisto tênis feminino se tiver mulher bonita jogando”. Infelizmente os Jogos Femininos ainda são tratados como um desfile de moda, valoriza-se mais a beleza das atletas e as roupas que estão usando, do que questões relacionadas ao jogo, como: técnica, agilidade, garra, inteligência e tática.

Desde o início das irmãs o Williams, os jogos femininos passaram por uma mudança gradativa muito grande. Passaram a ser jogados majoritariamente no fundo da quadra, com muitas pancadas e pouquíssimas variações de golpe. As atletas estão muito mais fortes, treinam e malham todo dia. Sobrevivem aquelas com melhor condicionamento físico, tanto em força quanto em resistência. Variações como slices, curtinhas, jogo de rede, entre outros, são quase inexistentes, o que torna os jogos menos dinâmicos que os masculinos.

Isso, porém, não justifica as atitudes citadas. Sim, o jogo é diferente, mas não deixa de ser difícil e exigir muito treino e disciplina. Já está mais do que na hora de valorizar as atletas pelo seu esforço, preparo, suas táticas e inteligência, porque são esses fatores que realmente determinam quem vencerá. Ter a saia mais bonita ou gemer mais baixo não vence set.

11. Ainda não chegamos lá

Citaremos agora dois acontecimentos dos últimos dois anos, que mostram que ainda temos muito trabalho pela frente.

Serena Williams – 2018:

A atleta mais bem paga do mundo foi mãe em setembro de 2017, teve sua “licença maternidade” e retornou as quadras em 2018. Pensando nas consequências fisiológicas de se ter um filho, a Nike criou uma roupa exclusiva para atleta retornar para as quadras.

O macacão de manga curta, justo, preto, com uma faixa vermelha em volta da cintura foi sucesso absoluto. O modelo, apelidado de Wakanda em referência ao filme Pantera Negra, foi planejado para ajudar na circulação sanguínea da atleta e evitar a formação de coágulos. Serena chegou a dizer que se sentia uma super-heroína com a roupa que, para ela, representava todas as mães que voltam do parto e tentam “permanecer ferozes”.

Mas a felicidade durou pouco. O presidente da Federação de Tênis da França, Bernard Giudicelli, vetou o uso da roupa em uma tentativa de “impor certos limites” para “respeitar o jogo e o local”, de acordo com ele. Disse que a roupa era muito justa, e destacava demais as curvas da atleta. A indignação foi grande, e a Nike não se calou perante a censura. Lançou a campanha “Você pode tirar uma super-heroína de sua fantasia, mas nunca levar dela seus poderes”. Para completar, criou um modelo novo para atleta, consistindo no tão conhecido short-saia, blusa justa estilizada, meia arrastão e tênis, tudo na cor preta. O presidente não se pronunciou dessa vez.

Alizé Cornet – 2019:

A tenista francesa se retirou em um dos intervalos do jogo para ir ao vestiário, retornou e se direcionou ao fundo da quadra para retomar o jogo, ao chegar ao fundo, percebeu que sua camisa estava do avesso, ela então retirou a camisa, desvirou-a e vestiu-a novamente. Isso ocorreu em menos de dez segundos, que foram suficientes para render-lhe uma punição.

O árbitro puniu Cornet por tirar a blusa em quadra, a atleta ficou indignada e não houve nada que pudesse ser feito ali. O caso causou comoção pública, a própria Judy Murray, mãe de Andy Murray, postou em suas redes sociais um comentário a respeito da punição, dizendo que nunca tinha visto nenhum homem ser punido por trocar de camisa em quadra, e é algo que eles fazem o tempo todo.

As repercussões fizeram com que a USTA (Associação de Tênis dos Estados Unidos) passasse a permitir a troca de roupa em quadra, desde que sentados no banco, por homens e mulheres.

Claramente, o caminho percorrido ao longo dos anos foi longo, o tênis é um grande exemplo na busca pela igualdade de gênero no esporte. Mas ainda há muito território a ser conquistado. Episódios de assédio ainda são muito comuns, totalmente desalinhados com os princípios básicos da igualdade e da liberdade de expressão. Cabe a todos trabalhar para que essa realidade seja alterada, dentro e fora do esporte.